Após Recurso, contas do IAT referentes ao contrato de recuperação da orla de Matinhos são julgadas regulares com ressalvas

Obras de engorda da orla de Matinhos, no Balneário Caiobá, no litoral paranaense. Foto: divulgação.

Acompanhando o opinativo do Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR), os membros do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR) deram parcial provimento ao Recurso de Revista apresentado pelo Consórcio Sambaqui, contra o Acórdão n° 2442/23 do Tribunal Pleno, o qual julgou procedente Tomada de Contas Extraordinária.  

O processo de Tomada de Contas se refere ao Contrato nº 08/22, firmado entre o Instituto Água e Terra (IAT) e o Consórcio recorrente, tendo por objeto a recuperação da orla de Matinhos (no valor de R$ 314.898.549,90 e prazo de conclusão de 32 meses). 

Com a nova decisão, as contas do Instituto, em relação ao referido contrato, foram consideradas regulares, ressalvados os apontamentos quanto ao “descumprimento do projeto básico, memorial, especificações técnicas e cronograma previstos no edital” e “ausência de Termo Aditivo que formalizasse as alterações realizadas no Plano de Trabalho que integram o contrato”. 

Entenda o caso

A Tomada de Contas Extraordinária foi instaurada por solicitação da 3ª Inspetoria de Controle Externo (3ª ICE), a qual comunicou ter constatado modificação nas etapas de execução da obra para a recuperação da orla de Matinhos sem a prévia anuência do IAT e do engenheiro projetista. 

Dentre os achados de fiscalização, verificou-se que houve o i) descumprimento do projeto básico, memorial, especificações técnicas e cronograma previstos no edital, sem a previsão das medidas mitigatórias de danos para garantir a segurança e durabilidade da obra; ii) descumprimento do contrato por ausência de Termo Aditivo que formalizasse as alterações realizadas no Plano de Trabalho que integram o contrato; e iii) ausência de análise de impacto econômico-financeiro pelo adiantamento em oito meses da maior parcela do contrato, referente a R$124.564.615,34, bem como pela diminuição do tempo de obra, nos termos do art. 65, II, d, da Lei 8.666/1993. 

Em 17 de agosto, durante a Sessão Ordinária Virtual n° 15, por maioria dos votos, os Membros do Tribunal Pleno julgaram procedente a Tomada de Contas Extraordinária, determinando a adoção, pelo Instituto Água e Terra, de diversas medidas visando sanar as irregularidades apontadas.  

Recurso de Revista 

Ao ingressar com o Recurso, o Consórcio Sambaqui, representado por sua empresa líder Castilho Engenharia e Empreendimentos S.A., alegou que todas as premissas do projeto foram mantidas intactas e que o adiantamento da obra somente foi iniciado após a autorização do projetista responsável. Nesse aspecto, sustentou que a execução da engorda e das estruturas semirrígidas, que antes era para ser feita de forma sucessiva, foi antecipada de modo a ocorrer concomitantemente, o que teria resultado em vantagens à Administração e à população, como o aumento do fluxo do turismo no litoral e diminuição do valor do reajuste contratual. 

Além disso, a empresa reforçou que por iniciativa própria iniciou os serviços preliminares de mobilização, de modo que, caso o adiantamento não fosse aprovado pelo IAT e projetista, poder-se-ia exigir do Consórcio a desmobilização dos equipamentos, por sua conta. 

No que se refere às medidas mitigatórias, apresentou a previsão da manutenção das cotas previstas em projeto para execução das estruturas semirrígidas; remoção de material por escavadeira e/ou draga, para manutenção do caimento/cota de projeto nos canais; a responsabilidade do Consórcio em caso de necessidade refazimento de serviços em razão da antecipação da engorda; e a melhoria do perfil da engorda, com base em experiências de obras anteriores.  

Ao final, argumentou que a previsão de vida útil da obra é de difícil estimativa e que o adiantamento em oito meses da etapa da engorda da faixa de areia não traria grande impacto à vida útil do projeto. Sendo assim, entende que a inclusão de responsabilidade do Consórcio por todo prazo de vida útil da obra seria injustificável, além de que jamais esteve tal medida prevista na licitação ou no contrato. 

Diante do exposto, o recorrente pugnou pelo provimento do Recurso de Revista, a fim de que fossem afastadas quaisquer responsabilizações ou ampliações das responsabilidades do Consórcio.  

Instrução do Processo 

O Recurso de Revista foi recebido por meio do Despacho n° 1.498/23 do Conselheiro Maurício Requião de Mello e Silva, tendo sido encaminhado para manifestação da Coordenadoria-Geral de Fiscalização (CGF), a qual se manifestou pela manutenção da decisão pela irregularidade das contas do IAT e, consequentemente, pela procedência da Tomada de Contas Extraordinária.  

Afirmou a unidade técnica que a movimentação no canteiro de obras na orla de Matinhos ocorreu muitos antes da anuência do projetista e do IAT, e que haveria o risco remanescente de tais alterações empreendidas pelo Consórcio, pois diversas estruturas semirrígidas ainda estavam em execução, mesmo após a conclusão da engorda da faixa de areia da orla. 

Relativamente às determinações constantes na decisão recorrida (Acórdão nº 2442/23), a CGF entendeu que as alegações do Consórcio não foram capazes de afastar as irregularidades apontadas. Contudo, apenas em relação à determinação que dizia respeito a realização de análise de impacto orçamentário-financeiro no contrato, devido ao adiantamento da engorda da praia e à diminuição do tempo da obra, considerou que a mesma poderia ser suprimida, pois não haveria efeito material direto no objeto em análise. 

Ministério Público de Contas 

Instado a se manifestar, o MPC-PR divergiu do entendimento da unidade técnica ao considerar que o Consórcio demonstrou que a antecipação da etapa de engorda da faixa de areia, além de ser medida vantajosa para o interesse público, contou com a anuência da autarquia contratante e do engenheiro projetista, assim como foi precedida de previsão de ações mitigadoras, necessárias a garantia da máxima segurança da obra. 

De igual forma, avaliou procedente a alegação recursal de que o Consórcio não se comprometeu a estender sua responsabilidade por todo o período de vida útil da obra, mas sim por eventual execução de novos serviços comprovadamente originários da antecipação da etapa de engorda. Ademais, ressaltou que, de acordo com a Cláusula Quinta, item LVIII, do Contrato nº 08/2022, será de cinco anos, contados da emissão do Termo de Recebimento Definitivo, a responsabilidade do Consórcio em reparar qualquer defeito na execução das obras. 

Nesse sentido, em que pese a motivação da louvável fiscalização empreendida pela 3ª Inspetoria de Controle Externo, a antecipação de etapa da execução do contrato foi concluída, sem que tenha havido qualquer apontamento concreto de prejuízo à solidez do resultado esperado da obra. De todo modo, como a finalização do Contrato nº 08/2022 está prevista para o ano de 2024, compete à atual Inspetoria de Controle Externo (1ICE), responsável pela fiscalização do IAT, acompanhar o restante da execução dos serviços contratados, podendo, se for o caso, adotar as medidas previstas no art. 157 do Regimento Interno, na hipótese de constatação de irregularidade(s) superveniente(s). 

O MPC-PR também pontuou que, diante da opção do IAT em não recorrer do Acórdão nº 2442/23, devem ser mantidas as obrigações de fazer indicadas no item II da decisão recorrida, excetuada aquela indicada no item II subitem iv, consoante sugerido pela CGF. No mesmo sentido, não vislumbra motivo para afastamento das determinações constantes do item v, subitem v.1, item vi e item vii, competindo àquela autarquia demonstrar a atendimento de tais medidas na fase de cumprimento da decisão. 

Por essas razões, mediante o Parecer n° 1055/23, o Ministério Público de Contas opinou pelo provimento parcial do recurso, propondo o julgamento pela regularidade das contas do IAT, com a conversão em ressalva das irregularidades referentes a “ausência da análise do impacto econômico-financeiro pelo adiantamento da obra”, bem como da “ausência do Termo Aditivo que formalizasse as alterações realizadas no Plano de Trabalho”, assim como a manutenção de parte das obrigações de fazer dirigidas ao Instituto. 

Decisão 

Em sede de julgamento, o Relator Conselheiro Fabio de Souza Camargo acolheu a manifestação do MPC-PR como forma de decidir. Todavia, destacou que, a despeito do IAT não ter apresentado recurso contra a decisão proferida no Acórdão n° º 2053/24, os efeitos desse novo julgamento se estendem à autarquia. 

Quanto às irregularidades apontadas pela 3ª ICE, embora se compreenda pela existência de impropriedades, a Inspetoria não propôs medidas ressarcitórias ou sancionatórias, bem como nenhum prejuízo concreto foi identificado ou comprovado. Portanto, entendo que as determinações impostas são suficientes para que eventuais prejuízos sejam prevenidos.  

Ante o exposto, os Membros do Tribunal Pleno acompanharam o voto do Relator, a fim de dar conhecimento e parcial provimento do Recurso de Revista apresentado contra o Acórdão nº 2.442/23 (STP), para que as contas do Instituto Água e Terra, em relação ao Contrato nº 08/2022, sejam julgadas regulares, ressalvados os apontamentos propostos pelo MPC-PR, assim como afastadas as determinações indicadas no parecer ministerial, mantendo-se as seguintes determinações ao IAT: 

  1. Providencie a Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) do “Parecer sobre alteração do cronograma”, de 23 de junho de 2022, elaborado pelo engenheiro João Claudio Martins Cassar (CREA/RJ 199010444-D); 
  2. Complemente o plano de trabalho para que conste a definição do prazo de vida útil, condições de manutenção das estruturas marítimas e da faixa de areia, bem como a previsão de levantamentos batimétricos para avaliação da perda de sedimentos decorrentes da alteração proposta pela empresa, com a devida emissão de Anotação de Responsabilidade Técnica (ART); 
  3. Retifique os quantitativos relativos às batimetrias atualizadas, validando adequadamente os resultados fornecidos pela contratada, sem prejuízo de apuração de responsabilidade em caso de erros de planejamento e projeto; ]
  4. Edite Termo Aditivo para formalizar adequadamente as alterações no Plano de Trabalho, nos termos do art. 65, II, b, da Lei 8.666/1993.
  5. Notifique a seguradora do contrato, conforme previsão da Cláusula Quinta, LCIV, 1 e 3, informando-a das modificações realizadas no projeto e na execução da obra, aditando o contrato de seguro para que a informação seja formalizada;
  6. Apresente relatório detalhado de como foram e tem sido realizadas as medidas mitigatórias apresentadas pelo Consórcio Sambaqui na peça 44, ponto V, p. 15-19. 

 

Informação para consulta processual

Processo nº: 692827/23
Acórdão nº: Acórdão  nº 2053/24 – Tribunal Pleno
Assunto: Recurso de Revista
Entidade: Instituto Água e Terra (IAT)
Relator: Conselheiro Fabio de Souza Camargo