Consulta esclarece condições para indenização de férias dos Prefeitos Municipais

Igreja de São Sebastião Wenceslau, localizada no Município de Wenceslau Braz, na região Norte Pioneiro do Estado do Paraná. Foto: Divulgação/José Reynaldo da Fonseca.

Os membros do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) responderam, recentemente, ao processo de consulta formulado pelo Município de Wenceslau Braz, o qual questionava sobre a hipótese de indenização de férias não usufruídas pelos Prefeitos Municipais, e quais seriam as condições e períodos para tal. 

A consulta foi recebida conforme Despacho do Conselheiro Augustinho Zucchi, nº 250/23, visto estarem presentes todos os requisitos para autuação do processo perante o TCE-PR, como: ser formulada por autoridade legítima, conter apresentação objetiva dos quesitos, versar sobre dúvida na aplicação de dispositivos legais, ser instruída por parecer jurídico e ser formulada em tese.  

Questionamentos 

O Município de Wenceslau Braz, representado pelo Prefeito Atahyde Ferreira dos Santos Júnior, apresentou os seguintes questionamentos: 

“a) Em razão do exercício contínuo das atividades do prefeito municipal, com dedicação exclusiva, equiparando-se a qualquer trabalhador urbano, é admitida a indenização de férias não gozadas? 

b) A indenização de férias não gozadas somente será devida quando atendidas, cumulativamente, as seguintes condições: ter o beneficiário concluído o mandato eletivo ou do afastamento do respectivo cargo sem o gozo das férias; existir expressa autorização em lei local para a concessão do adicional e para a indenização? 

c) A indenização por férias não gozadas poderá ocorrer no decorrer da legislatura referente aos períodos já vencidos, entendidos como os períodos 2021/2021 e 2022/2022? Caso ocorra o pagamento de tal verba, há de se reconhecer como indevidos os pagamentos efetivados a tal título, impondo-se, por conseguinte, o ressarcimento de tais valores?”

 Junto à inicial estava o Parecer Jurídico da Procuradoria Municipal, afirmando que existe Lei Municipal que reconhece o direito a férias do Prefeito. Contudo, a legislação deixou regulamentar a questão sobre a possibilidade do recebimento em espécie dos valores referentes à sua indenização, motivo pelo qual se busca a orientação junto ao TCE-PR. 

A justificativa para a interposição do processo se deu em razão da realização de diversas obras do Município, motivo pelo qual o atual Prefeito não poderia se ausentar do cargo para usufruir de suas férias. Em que pese ainda exista um tempo considerável até o fim de seu mandato, a Procuradoria entendeu cabível a orientação do TCE-PR em tempo hábil, de modo a evitar quaisquer irregularidades futuras. 

Análise técnica 

Instada a se manifestar, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM), conforme Instrução nº 3145/23, concluiu pelo recebimento da consulta e resposta no sentido de que é admitida a indenização de férias não usufruídas, quando assim demonstrado o exercício contínuo das atividades do Prefeito Municipal, além de ser um direito social previsto pela própria Constituição Federal (artigo 7º, incisos VIII e XVII; e artigo 39, §3º e 4º).  

No entanto, a indenização somente será devida quando forem preenchidas três condições: I) existência de legislação municipal que regulamente o direito ao recebimento de férias, com a devida viabilidade orçamentária e financeira para sua concessão; II) ter o gestor municipal concluído seu mandato sem o gozo das férias, devendo a indenização ser realizada apenas após o final do mandato; e III) ter o impedimento ao gozo das férias se dado em razão de necessidade da administração, de forma excepcional, devendo o gestor municipal colacionar documentos e justificativas à entidade administrativa que demonstrem a impossibilidade do usufruto do direito sem prejuízo à atividade e obrigações inerentes ao cargo. 

A CGM esclareceu, ainda, caso o pagamento da indenização seja feito no decorrer do mandato, o pagamento será reconhecido como indevido, impondo-se o ressarcimento dos valores, com incidência de juros e correção monetária. 

MPC-PR 

O Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR), por sua vez, conforme fundamentação exposta no Parecer nº 195/23, mencionou a necessidade de ser respeitado o Princípio da Legalidade, devendo existir Lei Municipal que regulamente a concessão de férias. No mesmo sentido, respondeu os questionamentos seguintes pela possibilidade da conversão das férias não gozadas em pecúnia, de modo que tal indenização só poderá ser realizada após o final do mandato, em caráter excepcional, quando o beneficiário não mais puder usufruí-las oportunamente.  

Decisão 

Os Membros do Tribunal Pleno do TCE-PR votaram, em unanimidade, conforme fundamentação exposta no Acórdão nº 2361/24, em responder as perguntas nos seguintes termos: 

a) Em razão do exercício contínuo das atividades do prefeito municipal, com dedicação exclusiva, equiparando-se a qualquer trabalhador urbano, é admitida a indenização de férias não gozadas? 

Resposta: O gozo de férias anuais é decorrente de um direito social reconhecido a todos os trabalhadores, nos termos do disposto no §4º, do art. 39, c/c inciso XVII, do art. 7º, da Constituição Federal, havendo inclusive decisão do Supremo Tribunal Federal acerca do reconhecimento de tal direito, em sede de repercussão geral (Recurso Extraordinário nº 650.898). Nestes termos e com amparo no Acórdão nº 4529/17-Tribunal Pleno, tanto a previsão das férias remuneradas quanto a possibilidade de conversão de férias não gozadas em pecúnia, ambas necessariamente deverão estar previstas em lei, em homenagem ao princípio da legalidade. 

b) A indenização de férias não gozadas somente será devida quando atendidas, cumulativamente, as seguintes condições: ter o beneficiário concluído o mandato eletivo ou do afastamento do respectivo cargo sem o gozo das férias; existir expressa autorização em lei local para a concessão do adicional e para a indenização?  

Resposta: A indenização de férias não gozadas ao Prefeito Municipal somente será devida quando atendidas, cumulativamente, as seguintes condições: (I) existir legislação municipal que preveja o direito ao recebimento de férias anuais remuneradas e adicional de um terço aos gestores municipais, assim como viabilidade orçamentária e financeira para a sua concessão, que deve levar em conta a realidade financeira do Município, a Lei de Diretrizes Orçamentária, a Lei Orçamentária Anual, a Lei de Responsabilidade Fiscal, notadamente, seus arts. 16 e 17 e os limites do art. 29-A e §1º da Constituição Federal, não sendo necessário, contudo, a existência de lei prevendo expressamente o direito à indenização no caso de férias não gozadas, uma vez que se trata de direito decorrente daquele; (II) ter o gestor municipal concluído o mandato sem o gozo das férias, sendo que a indenização deverá ser recebida somente após o final do mandato; (III) ter o impedimento ao gozo das férias se dado em razão de necessidade da administração, de forma excepcional, devendo o gestor municipal colacionar documentos e justificativas à entidade administrativa que demonstrem a impossibilidade do usufruto do direito sem prejuízo à atividade e obrigações inerentes ao cargo. 

c) A indenização por férias não gozadas poderá ocorrer no decorrer da legislatura referente aos períodos já vencidos, entendidos como os períodos 2021/2021 e 2022/2022? Caso ocorra o pagamento de tal verba, há de se reconhecer como indevidos os pagamentos efetivados a tal título, impondo-se, por conseguinte, o ressarcimento de tais valores?

Resposta: A conversão em pecúnia do valor das férias vencidas e não gozadas no decorrer da legislatura referente aos períodos já vencidos é indevida, uma vez que as férias poderão ser usufruídas oportunamente, sendo que a indenização das férias vencidas e não usufruídas na atividade é devida somente após o término do mandato do gestor municipal. No caso de pagamento de indenização no decorrer do mandato, deve ser reconhecido como indevido o pagamento efetivado a tal título, impondo-se o ressarcimento de tais valores, com incidência de juros e correção monetária a partir da data do pagamento indevido. 

Após o trânsito em julgado da decisão, os autos foram encaminhados à Supervisão de Jurisprudência e Biblioteca (SJB) para os registros pertinentes, visto que os processos de consulta possuem força normativa e servem como fundamento para as decisões futuras do TCE-PR que possuam, em todo ou em parte, o mesmo objeto dos questionamentos feitos pelo consulente 

 

Informação para consulta processual

Processo nº: 272732/23
Acórdão nº: Acórdão  nº 2361/24 – Tribunal Pleno
Assunto: Consulta
Entidade: Município de Wenceslau Braz
Relator: Conselheiro Augustinho Zucchi