Decisão em sede de consulta sobre aplicação do RGPS é reformulada após recurso interposto pelo MPC-PR

O Município de Porto Amazonas está localizado próximo a Palmeira, Lapa e Balsa Nova. Sua população estimada é de
4.098
habitantes (IBGE 2022). Foto: divulgação.

O Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR) apresentou Embargos de Declaração em processo de consulta formulado pelo Município de Porto Amazonas a fim de complementar a resposta dada ao questionamento nº 1. 

A consulta questionava sobre a possibilidade jurídica de servidor efetivo em atividade, aposentado voluntariamente pelo Regime Geral de Previdência Social – RPGS, em data anterior à última reforma de previdência (Emenda Constitucional Nº 103/2019), acumular os proventos de aposentadoria com os vencimentos do mesmo cargo, caso tenha permanecido em atividade. 

Decisão originária 

A Consulta formulada pelo Município de Porto Amazonas foi devidamente recebida após verificação dos requisitos de admissibilidade, conforme Despacho do Relator nº 143/22. 

Em sessão de julgamento pelo Pleno do Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR), conforme fundamentação contida no Acórdão nº 3814/23, os Membros votaram em responder aos questionamentos da consulta da seguinte forma: 

1. É possível que ocupantes de cargo de provimento efetivo aposentados voluntariamente em data anterior a Emenda Constitucional 103/2019, pelo Regime Geral de Previdência Social, continuem a exercer as funções do cargo regularmente, recebendo cumulativamente vencimentos de cargo público e proventos de aposentadoria provenientes do mesmo cargo público?  Resposta: Aos ocupantes de cargo de provimento efetivo aposentados voluntariamente pelo Regime Geral de Previdência Social e que tenham permanecido em atividade, desde que em data anterior à Emenda Constitucional nº 103/2019, é permitido que continuem a exercer suas funções regularmente, recebendo cumulativamente vencimentos de cargo público com os proventos de aposentadoria do Regime Geral de Previdência.

 

2. Em sendo possível em quais condições?  Resposta: O tempo de contribuição utilizado para a aposentadoria concedida pelo Regime Geral de Previdência Social em data anterior a Emenda Constitucional 103/2019 não pode ser utilizado para fins de nova aposentadoria. Não pode ocorrer qualquer forma de aproveitamento do período de contribuição utilizado na concessão da aposentadoria, vedada inclusive a concessão de vantagens remuneratórias ao servidor público em atividade que levem em consideração o referido tempo de serviço, nos termos das respostas com força vinculante do Acórdão nº 1468/19 – Tribunal Pleno.  

 

 3. Não sendo possível qual a medida a ser tomada? Resposta prejudicada. 

 

 4. A EC 103/19, incluiu o § 14, ao art. 37, da Constituição Federal, que dispõe expressamente que a aposentadora concedida com a utilização de tempo de contribuição decorrente de cargo, emprego ou função pública, inviabiliza a permanência no emprego. O STF ao analisar o Tema 606/STF – RE 655283, firmou tese, no sentido de que os empregados públicos, que tiveram aposentadora concedida pelo Regime Geral da Previdência Social até a data da Emenda Constitucional 103/19, poderão permanecer no emprego público, com base no art. 6º da Emenda. Tal entendimento se aplica aos ocupantes de cargo de provimento efetivo dos Municípios, aposentados voluntariamente pelo Regime Geral de Previdência Social, que requereram o benefício em data anterior à EC 103/19 e tiveram o reconhecimento após a vigência da Emenda?  Resposta: Aos atuais ocupantes de cargo de provimento efetivo dos Municípios, aposentados voluntariamente pelo Regime Geral de Previdência Social, que requereram aposentadoria ao INSS em data anterior à vigência da EC nº 103/19 (13/11/2019), cujo deferimento ocorreu somente após sua vigência, deve ser reconhecido seu direito a permanecerem na ativa, com a possibilidade de acumular o benefício previdenciário com a respectiva remuneração da ativa.  

 

 5. Sendo aplicado, quais as condições?  Resposta na questão anterior.  

 

 6. Não sendo aplicado, qual a medida a ser tomada?  Resposta prejudicada.  

 

 7. Existe possível violação quanto às regras do exercício de cargo público de provimento efetivo, caso o agente receba cumulativamente proventos do Regime Geral de Previdência Social com vencimentos da ativa provenientes do mesmo cardo de provimento efetivo? Respondido nas questões anteriores. 

Embargos de Declaração 

Em tempo hábil, o MPC-PR apresentou recurso perante a decisão contida no Acórdão nº 3814/23, afirmando, preliminarmente, do cabimento excepcional dos Embargos de Declaração em processos de Consulta, visto que seu cabimento é aceito perante decisão que omita ponto sobre a qual deveria pronunciar-se.  

Ainda, ressaltou que o próprio TCE-PR já reconheceu o cabimento de embargos em consulta, dentre os quais destaca-se o Acórdão nº 1051/22 (Processo nº 382383/20) e Acórdão nº 1443/23 (Processo nº 502354/20). 

No mérito, a Procuradoria-Geral do MPC-PR, ao rever o entendimento exarado na decisão, verificou que a Tema nº 606 do Supremo Tribunal Federal (STF) não abarca os servidores titulares de cargos públicos efetivos, mas sim dos empregados públicos: “A concessão de aposentadoria aos empregados públicos inviabiliza a permanência no emprego, nos termos do art. 37, § 14, da CRFB, salvo para as aposentadorias concedidas pelo Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 103/19, nos termos do que dispõe seu art. 6º”. 

Esta distinção é fundamental para assegurar a solidez do entendimento consagrado no STF quanto à efetiva ocorrência de rompimento do vínculo estatutário com o advento da aposentadoria do servidor público, ainda que sob o RGPS, mormente nos casos em que o estatuto contemplar tal fato jurídico como hipótese de vacância do cargo público. 

Nesse sentido, considerou a tese firmada no Tema nº 1150 de repercussão geral do STF, nos seguintes termos: “o servidor público aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social, com previsão de vacância do cargo em lei local, não tem direito a ser reintegrado ao mesmo cargo no qual se aposentou ou nele manter-se, por violação à regra do concurso público e à impossibilidade de acumulação de proventos e remuneração não acumuláveis em atividade”.  

Deste modo, considerou necessário complementar a resposta ofertada pelo Plenário no que diz respeito ao Questionamento nº 1, para que passe a constar a ressalva de que a possibilidade ali definida está condicionada à inexistência de legislação municipal que estabeleça a aposentadoria em hipótese de vacância.  

Sanadas tais omissões, sugeriu a complementação da resposta ao questionamento nos seguintes termos:  

“Dessa sorte, sanadas tais omissões, sugere-se a complementação da resposta ao quesito 1, nos seguintes termos: Aos ocupantes de cargo de provimento efetivo aposentados voluntariamente pelo Regime Geral de Previdência Social e que tenham permanecido em atividade, desde que em data anterior à Emenda Constitucional nº 103/2019, é permitido que continuem a exercer suas funções regularmente, até completar a idade que enseja a aposentadoria compulsória, nos termos da Lei Complementar nº 152/2015, recebendo cumulativamente vencimentos de cargo público com os proventos de aposentadoria do Regime Geral de Previdência, desde que a legislação local não preveja a aposentadoria como hipótese de vacância do cargo público efetivo, nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”. 

Nova decisão 

Instada a se manifestar, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM), conforme Instrução nº 4745/24, corroborou a complementação trazida pelo Ministério Público de Contas, não se opondo a nova resposta ao quesito 1. 

Em nova apreciação pelo Tribunal Pleno, o Conselheiro Ivan Lelis Bonilha, conforme fundamentação do Acórdão nº 3922/24, ratificou o recebimento dos embargos, visto que tempestivos, procedimentalmente adequados, propostos por parte legítima e fundados em interesse processual. 

No mérito, sobre o acréscimo da expressão “até completar a idade que enseja a aposentadoria compulsória, nos termos da Lei Complementar nº 152/2015”, observa-se que essa disposição está fundamentada no art. 40, § 1º, inc. II da Constituição Federal, integrado pela Lei Complementar nº 152/20154. Essa norma esclarece que a permanência em atividade de servidores aposentados voluntariamente pelo Regime Geral de Previdência Social, desde que em data anterior à Emenda Constitucional nº 103/2019, não deve se prolongar indefinidamente, devendo respeitar a idade máxima para aposentadoria compulsória.  

Quanto à adição da expressão “desde que a legislação local não preveja a aposentadoria como hipótese de vacância do cargo público efetivo, nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”, trata-se de outra limitação pertinente, caso esteja prevista no respectivo estatuto, conforme estabelecido na tese firmada no Tema nº 1150 de repercussão geral. 

Diante do exposto, o Conselheiro votou pelo conhecimento dos embargos declaratórios propostos pelo Ministério Público de Contas, acolhendo-os para aclarar o Acórdão nº 3814/23 – Tribunal Pleno, mediante a complementação da resposta ao quesito 1, com os acréscimos que abaixo destaco:  

“Aos ocupantes de cargo de provimento efetivo aposentados voluntariamente pelo Regime Geral de Previdência Social e que tenham permanecido em atividade, desde que em data anterior à Emenda Constitucional nº 103/2019, é permitido que continuem a exercer suas funções regularmente, até completar a idade que enseja a aposentadoria compulsória, nos termos da Lei Complementar nº 152/2015, recebendo cumulativamente vencimentos de cargo público com os proventos de aposentadoria do Regime Geral de Previdência, desde que a legislação local não preveja a aposentadoria como hipótese de vacância do cargo público efetivo, nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.” 

Informação para consulta processual

Processo nº: 43244/24
Acórdão nº: 3922/24 – Tribunal Pleno
Assunto: Consulta
Entidade: Município de Porto Amazonas
Relator: Conselheiro Ivan Lelis Bonilha