Definição de preferência em licitações para ME e EPP não fere as diretrizes de competitividade

Parque Aquático de Irati, inaugurado em 1989, em uma área aproximada de 79.000m². Foto: divulgação.

A definição de preferência em licitação para a contratação de microempresas (ME) ou empresas de pequeno porte (EPP) não fere as diretrizes de competitividade, pois encontra respaldo na Lei Complementar nº 123/2006. 

Esse foi o entendimento do Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR) ao analisar Representação da Lei de Licitações proposta pela empresa Mustang Atacado de Equipamentos Ltda em face do Município de Irati, em decorrência da realização do Pregão Eletrônico nº 77/2023, cujo objeto seria a aquisição de materiais de expediente, móveis, eletrodomésticos e eletroeletrônicos.  

Na inicial, a empresa representante alegou que a definição de critérios de preferência para ME e EPP, além de fixação de limitação geográfica, estaria ferindo o princípio da competitividade das licitações. 

Entenda o caso 

A representante destacou que a ausência de justificativa para a exigência de limitação geográfica violaria a ampla concorrência, ao considerar o caráter comum dos itens pretendidos, os quais possuem ampla disponibilidade no território nacional, de modo que a restrição de fornecedores poderia prejudicar a vantajosidade da contratação.   

Na mesma oportunidade informou que o Município não justificou as razões pelas quais definiu a prioridade de contratação de microempresas e empresas de pequeno porte locais ou regionais, de modo que estaria ferindo os princípios da legalidade, da impessoalidade, da competitividade e da isonomia. Ao final, a representante requereu a suspensão cautelar do certame e, no mérito, a retificação do ato questionado. 

Por meio do Despacho nº 1039/23, o Relator Conselheiro Ivens Zschoerper Linhares determinou o acolhimento da medida cautelar e imediata suspensão do Pregão Eletrônico nº 77/2023, ao considerar que o Município de Irati deixou de atender às impugnações feitas pelos participantes da licitação, não sendo possível identificar via portal de transparência municipal se houve resposta às impugnações apresentadas.  

Justificou que, embora as impugnações não possuam efeito suspensivo, o instrumento convocatório exige que elas sejam decididas em até um dia útil contado da data de seu recebimento. Ainda, afirmou que as impugnações tratam de questões relativas à competitividade, à descrição e ao preço de determinado item, bem como à qualificação técnica do contratado, pontos cuja relevância apenas ratifica a necessidade de se realizar o enfrentamento dos questionamentos levantados administrativamente.   

Manifestação das partes 

Em sede de defesa, o Município de Irati informou que o referido Pregão foi revogado, juntando documentação comprobatória.  

Na sequência, a empresa Representante juntou nova petição informando que o Município publicou novo certame (Pregão Eletrônico nº 109/23), contendo o mesmo objeto do Pregão anterior, assim como foi mantido no instrumento convocatório os mesmos itens que supostamente restringiram a competição por limitações geográficas.  

Sendo assim, nos termos do Despacho nº 1553/23, foi admitido, como emenda à inicial, a petição e documentos apresentados. Em razão da alteração dos limites objetivos da Representação em análise, que admitiu a inclusão do Pregão Eletrônico n° 109/23, o feito retornou à fase inicial, oportunidade em que foi concedido novo contraditório ao Município de Irati. 

Em nova manifestação, a municipalidade argumentou que os fatos em tela não seriam abrangidos pelo Prejulgado nº 27 do Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR), uma vez que o certame não é exclusivo para micro e pequenas empresas sediadas em seu local ou em região, mas, tão somente, com base na Lei Complementar Federal nº 123/06 e Lei Municipal nº 4.060/15, existe a previsão do direito de preferência. 

Ao final, informou que a Representante apenas buscou tumultuar o certame, na medida em que a suposta irregularidade (restrição geográfica indevida), além de não existir, não lhe prejudicaria, mas, pelo contrário, lhe seria benéfico, visto que possui sede na cidade de Rebouças, Município que é integrante da AMCESPAR. 

Análise Técnica 

Instada a se manifestar, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) opinou pela improcedência da Representação, ao considerar que o novo Edital nº 109/2023 não apresentou disposições relacionadas à exclusividade das microempresas, mas apenas dispôs sobre a preferência para contratação de empresa local/regional, devidamente amparado pela legislação local. Em comparação, o novo Pregão se mostra diferente do anterior, que era exclusivo às microempresas e empresas de pequeno porte do local/região.  

Ainda, a unidade técnica fundamentou que a Lei Complementar nº 123/2006 estabelece as diretrizes para a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito local. Nesse contexto normativo, destaca-se a concessão de tratamento diferenciado e favorecido às micro e pequenas empresas, fato que visa estimular a participação em processos licitatórios. Como bem pontuado no Despacho do Relator nº 1633/23, o TCE-PR firmou entendimento, por meio do Prejulgado nº 27, pela possibilidade de estipular margem de preferência geográfica para contratação de ME e EPP.  

Isto posto, observa-se que mesmo na ausência de normas suplementares, é possível estabelecer um limite de preferência para a contratação das micro e pequenas empresas, com base no artigo 48, §3°, da LC nº 123/06. Tal estipulação pode ser aplicada às empresas sediadas no local ou em uma região da qual o Município faça parte, desde que o referido limite não ultrapasse 10% do menor preço. 

Diante do exposto, tendo em vista que o edital está em acordo com a Lei Complementar nº 123/06, não existe fundamento para os argumentos da Representante, entendendo-se que as exigências questionadas em nada infringem os princípios norteadores das licitações e contratos públicos. 

O MPC-PR, conforme Parecer nº 193/24, acompanhou o entendimento da CGM, afirmando que o Edital em questão apenas estabeleceu o direito de preferência, então respaldado na legislação federal e municipal, motivo pelo qual a presente Representação deve ser julgada improcedente. 

Decisão 

Conforme voto contido no Acórdão nº 1051/24, os membros do Tribunal Pleno decidiram, em unanimidade, pela improcedência da Representação, tendo por base as análises realizadas que demonstraram não existir qualquer tipo de irregularidade no Pregão Eletrônico nº 109/2023, inclusive, em consideração às justificativas do Município de Irati em fortalecer a economia regional, remetendo a circulação dos recursos na região sede das empresas participantes.  

Ao final, os autos foram encaminhados à Diretoria de Protocolo para encerramento e arquivamento conforme disposto no Regimento Interno.  

 Informação para consulta processual

Processo nº: 520817/23
Acórdão nº: Acórdão  nº 1051/24 – Tribunal Pleno
Assunto: Representação da Lei de Licitações
Entidade: Município de Irati
Relator: Conselheiro Ivens Zschoerper Linhares