A Lei nº 14.133/21 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos) estabelece como regra que, os agentes públicos designados para desempenho das funções ditas essenciais devem ser selecionados, preferencialmente, entre servidores efetivos e empregados públicos, conforme o disposto no artigo 7º, inciso I. Contudo, se o Município não tiver condições de dar atendimento integral ao dispositivo de lei, desde que devidamente justificado e fundamentado, poderá indicar temporariamente servidor comissionado que detenha as qualificações técnicas necessárias para exercício da função.
Nessa última hipótese, destaca-se que não é possível a acumulação da remuneração de cargo em comissão com gratificação por função de confiança ou com outras gratificações instituídas em razão de condições excepcionais de serviço, consoante entendimento estabelecido pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR) no Prejulgado nº 25.
Essa foi a orientação do Tribunal Pleno da Corte de Contas, conforme Acórdão n° 3561/23, em resposta à Consulta formulada pelo Município de Cornélio Procópio. No processo questionou-se a respeito das funções atribuídas aos agentes públicos por meio da Lei nº 14.133/21: se poderiam ser exercidas por servidores comissionados e, em caso positivo, se os servidores do quadro de pessoal do Município poderiam receber gratificação pelo exercício de função até que sejam designados servidores efetivos.
Instrução do Processo
Acompanhando os autos, o parecer da assessoria jurídica do Município concluiu, em síntese, que as funções de agentes de contratação, pregoeiros, suplentes, equipe de apoio, comissão de contratação, gestor de contrato e fiscais de contrato poderão ser exercidas por servidores comissionados e que estes poderão receber gratificação pelo exercício da função, mediante lei autorizativa.
Instada a se manifestar, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM), mediante Instrução nº 2425/23, observou que conforme estabelecem os artigos 6º, inc. LX, 8º e 32, §1º, inc. XI da Lei nº 14.133/2021, as funções atribuídas aos agentes de contratação, pregoeiros e suplentes não podem ser exercidas por servidores comissionados. Isto porque devem ser servidores efetivos ou empregados públicos pertencentes aos quadros permanentes da Administração, ao menos três membros da comissão de contratação responsável por conduzir as licitações sob a modalidade diálogo competitivo, bem como pelo menos um membro da comissão de contratação que eventualmente venha a substituir o agente de contratação nas licitações que envolvam bens especiais.
Já as funções atribuídas aos demais agentes públicos referidos pela Lei de Licitações, a exemplo dos membros da equipe de apoio, gestores de contrato e fiscais de contrato, poderão ser exercidas por servidores comissionados, desde que sejam justificadas as razões da escolha do servidor comissionado em detrimento do servidor efetivo. Também deverão ser demonstradas a presença das atribuições de direção, chefia ou assessoramento referidas pelo artigo 37, inciso V da Constituição Federal, e as medidas concretas a serem adotadas para a resolução do obstáculo que impediu a designação de servidores efetivos.
Por fim, pontuou a unidade técnica que é vedada a instituição de gratificação a servidores ocupantes de cargo comissionado para o desempenho das funções essenciais à execução da Lei nº 14.133/21, pois o cargo em comissão já pressupõe o exercício de um encargo diferenciado, conforme decidido pelo TCE-PR na Consulta com força normativa nº 577361/16.
Mediante o Parecer n° 179/23, o Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR) destacou que a Lei nº 14.133/2021 não definiu de maneira taxativa ser apenas servidor efetivo ou empregado público os habilitados para o exercício das funções pertinentes a execução da referida norma. Entretanto, estabeleceu como regra geral que os agentes públicos que serão designados para atuarem nas funções essenciais de licitações e contratos deverão, preferencialmente, ser servidores efetivos ou empregados públicos do quadro permanente, de modo que a eventual escolha de servidores comissionados deverá ser devidamente fundamentada e motivada pela autoridade competente.
Ademais, observou que a lei de licitações conferiu prazo de dois anos para adequação da Administração Pública, seja para qualificação de seus servidores ou para a realização de concurso público. Dessa forma, entende que a mera alegação de insuficiência de servidores qualificados não possui justificativa viável para indicação de servidores comissionados para ocupar as funções essenciais previstas nos artigos 6º, inciso LX, 8º e 32, §1º, inciso XI da referida norma.
Quanto a possibilidade de instituição de gratificação a servidores comissionados designados para exercer as funções previstas na lei de licitações, verifica-se que por tratar-se de cargos por natureza destinados a atribuições de direção, chefia e assessoramento, tem caminhado a jurisprudência a compreender que a remuneração a eles legalmente fixada já engloba a retribuição pelo exercício de sua função em tempo integral, o que impediria, por exemplo, o pagamento de gratificação relacionada ao trabalho de horas extras. Ainda, por possuírem a mesma finalidade constitucional (desempenho de atribuições de direção, chefia e assessoramento), vedou-se a acumulação de cargo em comissão com função comissionada.
Assim sendo, não seria lícito cumular a retribuição do cargo com gratificação pelo exercício de outras funções, seja por já estarem abrangidas pela remuneração do cargo (vedando-se o pagamento em duplicidade, portanto), seja em razão da dedicação exclusiva demandada pelas funções de direção, chefia e assessoramento (vedando-se a atribuição de novas obrigações funcionais ao servidor, portanto).
Decisão
Em sede de julgamento, o Relator Conselheiro Jose Durval Mattos do Amaral acompanhou as manifestações da CGM e MPC-PR, conforme fundamentação contida no Acórdão nº 3561/23. Nesse sentido, pontuou que a preferência por servidores efetivos ou empregados públicos dos quadros permanentes da administração para desempenhar as funções essenciais à execução da lei de licitações denota viés mandatório, e que eventual ação contrária demanda justificativas acerca da impraticabilidade de se satisfazer o que preconiza a legislação especial.
Além disso, não basta se tratar de servidor efetivo ou empregado público constante do quadro permanente, requer-se, em acréscimo, que os eleitos detenham atribuições relacionadas a licitações e contratos ou possuam formação compatível ou qualificação atestada por certificação profissional emitida por escola de governo criada e mantida pelo poder público.
Em relação ao segundo questionamento do Município, o Relator frisou que o TCE-PR possui entendimento fixado em sede de consulta com força normativa, em que não é admissível a acumulação da remuneração de cargo em comissão com gratificação por função de confiança ou com outras instituídas em razão de condições excepcionais de serviço, tal qual se verifica, também, do Prejulgado nº 25.
Diante do exposto, o Relator concluiu pela resposta no sentido se que a Lei nº 14.133/21 traz como regra que os agentes públicos designados para desempenho das funções ditas essenciais devem ser selecionados, preferencialmente, entre servidores efetivos e empregados públicos.
Caso o Município não tenha condições de dar atendimento à lei, de modo justificado e fundamentado, poderá indicar temporariamente servidor comissionado que detenha todas as qualificações impostas na legislação. O mesmo vale, especificamente, para as figuras dos agentes de contratação, da comissão de contratação e dos pregoeiros, integrantes do órgão de contratação, sendo vedada a acumulação da remuneração de cargo em comissão com gratificação por função de confiança ou com outras instituídas em razão de condições excepcionais de serviço, em conformidade ao entendimento fixado no Prejulgado nº 25 do TCE-PR.
Informação para consulta processual
Processo nº: 279036/23 Acórdão nº: Acórdão n° 3561/23 – Tribunal Pleno Assunto: Consulta Entidade: Município de Cornélio Procópio Relator: Conselheiro Jose Durval Mattos do Amaral