A conversão pecuniária da licença especial, com o servidor em atividade, depende de expressa previsão legal no âmbito de cada Poder, pois trata-se de norma pertinente ao regime jurídico de servidor público e dela decorrerá aumento de despesa. Ademais, a Administração Pública tem competência discricionária para definir as especificidades para concessão e fruição de licenças, desde que não prejudique o servidor, tampouco impeça ou inviabilize o exercício dos seus direitos.
Essa é a orientação do Pleno do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR), que acolheu o opinativo do Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR) na resposta à Consulta formulada pelo Prefeito do Município de Amaporã, Mauro Lemos, a respeito da concessão de licença-prêmio.
No documento, o gestor municipal indagou sobre a possibilidade de conversão em pecúnia das licenças acumuladas ao longo do tempo, nas seguintes situações: se não requeridas formalmente pelo servidor público em momento oportuno; se requeridas formalmente e/ou informalmente e não concedidas pela Administração Pública. Por fim, questionou também sobre a aplicação de tais possibilidades durante o período que os servidores ocuparam cargo de direção, chefia ou assessoramento.
Instrução do Processo
Junto à petição inicial foi encaminhado Parecer Jurídico da Procuradoria municipal, a qual se manifestou desfavoravelmente ao pagamento em pecúnia ou ao gozo das licenças prêmio não requeridas formalmente ou usufruídas nos cinco anos seguintes à data de aquisição do respectivo direito e antes que se “acumulassem” com os diretos às licenças subsequentes.
Instada a se manifestar, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) observou que a concessão de licença especial deve ter respaldo legal, de modo que o direito à fruição pressupõe o atendimento dos requisitos legais que o implementam. Quanto a conversão pecuniária, destacou que depende de expressa previsão legislativa, por se tratar de regime jurídico de servidor público e concomitantemente no aumento de despesa ao erário. No caso do Município de Amaporã, verificou-se que existe regulamentação específica sobre a fruição e conversão pecuniária da licença prêmio, a qual estabelece expressamente a necessidade de requerimento pelo servidor efeito e vedação em todas as hipóteses do acúmulo de duas licenças, seja em gozo ou em dinheiro.
Mediante o Parecer n° 166/22, o Ministério Público de Contas destacou a decisão do TCE-PR no Acórdão nº 3594/2010, que fixou entendimento a respeito da concessão e pagamento de licenças especiais, bem como observou que a jurisprudência evoluiu ao longo do tempo, em compasso com o posicionamento majoritário nacional, sendo atualmente admitido o pagamento indenizatório das licenças adquiridas e não gozadas em atividade, respeitado o princípio da vedação ao enriquecimento sem causa.
Além disso, observou que é indevida a interpretação tendente a acabar com o direito de fruição do afastamento enquanto o servidor público estiver em atividade, por conta do vínculo estatutário. Nesse sentido, o MPC-PR verificou que o mesmo tema já foi objeto de debate perante o Supremo Tribunal Federal (STF) na definição do Tema nº 635 de repercussão geral, bem como pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), o qual sedimentou a tese de que o rompimento do vínculo estatutário é que dá início à contagem do prazo prescricional para que o servidor pleiteie a indenização correspondente.
Decisão
O relator do processo, Conselheiro Fernando Augusto Mello Guimarães, acompanhou o opinativo do Ministério Público de Contas, enfatizando que o princípio da legalidade é a base da licença-prêmio, havendo necessidade de que conste expressamente na legislação que a rege. Deste modo, cada ente é competente para definir suas regras específicas, as quais devem ser observadas desde que não impossibilitem o direito do servidor.
Ainda, reiterou que a ausência de dispositivo legal expresso sobre licença especial não gozada e não computada, não retira do servidor a possibilidade de convertê-la em pecúnia, sendo impossível que a Administração Pública determine sua fruição sem que o servidor formalmente a requeira.
Mediante decisão expressa no Acórdão nº 3209/22, os membros do Tribunal Pleno acompanharam por unanimidade o voto do relator, a fim de responder à Consulta nos seguintes termos:
1. O direito à licença especial demanda expressa previsão legal, vindo a integrar o regime jurídico dos servidores públicos;
2. O direito à fruição da licença especial pressupõe o atendimento dos requisitos legais que o implementam; todavia, a Administração tem discricionariedade quanto ao tempo para sua concessão;
3. A possibilidade de conversão pecuniária da licença especial, com o servidor em atividade, depende de expressa previsão legal (lei em sentido formal, de iniciativa privativa no âmbito de cada Poder), porque se trata de norma pertinente ao regime jurídico de servidor público e dela decorrerá aumento de despesa;
4. Extinto o vínculo de prestação de trabalho com a Administração, é devida a indenização correspondente aos períodos de licença especial acaso adquiridos pelo servidor e não usufruídos em atividade;
5. O prazo prescricional para a satisfação da pretensão à indenização é regido pela legislação local, aplicando-se subsidiariamente a prescrição quinquenal prevista no Decreto nº 20.910/1932, cujo termo inicial é a extinção do vínculo de trabalho entre o servidor e a Administração;
6. Em havendo autorização legal à conversão pecuniária da licença especial, seu pagamento depende de compatibilidade orçamentária, não devendo, contudo, ser computada na apuração do limite constitucional de gastos com pessoal ante o que ficou decidido no item 2 do Acórdão 692/22 – TP, por possuir natureza indenizatória;
7. A fruição da licença especial ou a sua conversão em pecúnia com o servidor em atividade, quando legalmente prevista tal possibilidade, deve ocorrer mediante requerimento formal;
8. A licença especial diz respeito ao cargo efetivo, independente da função comissionada que o servidor exerceu ou esteja exercendo.
Informação para consulta processual
Processo nº: 383049/21 Acórdão nº 3209/22 – Tribunal Pleno Assunto: Consulta Entidade: Município de Amaporã Relator: Conselheiro Fernando Augusto Mello Guimarães