O Pleno do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR), acolhendo o Parecer do Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR), determinou a aplicação de multa aos servidores públicos membros da Comissão Permanente de Licitação do Município de Santa Lúcia, por infringência aos arts. 29 e 43, § 3º, da Lei nº 8.666/93, o que frustrou a competitividade do Edital de Concorrência Pública nº 003/2022. Na decisão, em que foi julgada procedente a Representação apresentada contra o certame, também foi aplicada multa ao Prefeito Renato Tonidandel.
O edital, destinado a concessão de Direito Real para uso de três barracões localizados à marginal da BR 116 no bairro Parque Industrial, foi impugnado por dois participantes inabilitados que, em seguida, apresentaram Representação perante o TCE-PR pugnando pela concessão de medida cautelar para imediata suspensão do procedimento licitatório, em razão de frustração do caráter competitivo da licitação.
Instrução do Processo
A Representação foi recebida e, quanto ao pedido cautelar, o relator entendeu que não foram cumpridos os requisitos legais (artigo 53 da Lei Orgânica e 400 do Regimento Interno TCE-PR), uma vez que os Representantes se limitaram a pleitear a suspensão do certame de forma genérica. Destacou, ainda, que a concessão da liminar prejudicaria a adjudicação do objeto feita à empresa que, de boa-fé, se comprometeu em entregar o objeto licitação, não podendo ser prejudicada pelas falhas da Administração.
Em sede de contraditório, conforme defesa apresentada pelo Prefeito Renato Tonidandel e pelo Presidente da Comissão Permanente de Licitação, informaram que a inabilitação das empresas representantes foi regular, tendo-se baseado no princípio da legalidade e da vinculação ao instrumento convocatório.
Instada a se manifestar, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) fundamentou que o ponto a ser verificado na análise processual é a legalidade ou não da desclassificação dos participantes na licitação. Observou que a inabilitação ocorreu em decorrência de mero vício formal, não sendo oportunizado aos requerentes a regularização das declarações que foram apresentadas equivocadamente, o que se caracteriza como formalismo exagerado, com evidente prejuízo à competitividade do certame, visto que se tratava de um erro sanável.
Tal fato representa afronta direta ao artigo 43, §3º da Lei de Licitações nº 8.666/1993 e, segundo entendimento do Tribunal de Contas da União (TCU), na falta de algum documento que não restrinja a competitividade ou impacte na formulação de propostas, podendo este ser corrigido, não há fundamento para inabilitação dos licitantes, sendo a falha considerada de caráter formal. Por este motivo, opinou pela procedência da Representação a aplicação de multa ao artigo 87, inciso IV, “g” da Lei Complementar Estadual nº 113/2005 ao Prefeito Renato Tonidandel.
Mediante o Parecer n° 885/22, o Ministério Público de Contas destacou ser inequívoco que os membros da Comissão Permanente de Licitação, ao inabilitar as empresas representantes em razão de erro e omissão formais, passíveis de saneamento, desconsideraram a faculdade prevista no art. 43, § 3º, da Lei 8.666/93. Ainda, observou que a desconsideração se reveste de maior gravidade, quando constatado que apenas 3 empresas acudiram ao certame, de modo que a inabilitação das duas empresas representantes, na prática, resultou na inevitabilidade do aceite de uma única proposta. No caso em tela, a decisão pela prevalência do formalismo exagerado, deu-se em evidente prejuízo à competividade da Concorrência.
Diante do exposto, o MPC-PR opinou pela procedência da Representação, a fim de que seja aplicada a multa prevista no artigo 87 da Lei Orgânica do TCE-PR aos servidores participantes da Comissão Permanente de Licitação, uma vez serem os subscritores do documento que declarou a inabilitação das referidas empresas.
Julgamento e Fase Recursal
Conforme voto contido no Acórdão nº 1000/23 do Tribunal Pleno do TCE-PR, o relator Conselheiro Maurício Requião de Mello e Silva frisou que o formalismo em licitações é tema comum a ser debatido na doutrina e jurisprudência pátria, no sentido de que exigências excessivas na execução do certame maculam a legislação aplicável por prejudicar ampla concorrência. Nesse sentido, não se pode excluir licitantes do processo de contratação em decorrência de questões irrelevantes, tais quais por omissões ou por irregularidades formais.
Quanto à definição de responsabilidades, a qual foi divergência entre a instrução da unidade técnica e parecer ministerial, têm-se que a inabilitação dos Representantes foi ato de responsabilidade direta dos membros da Comissão Permanente de Licitação, de modo que não há como eximi-los da sanção. Contudo, o Prefeito municipal é quem exerce o controle final de legalidade sobre o certame, sendo, desse modo, também responsável pelo ato que inabilitou os Representantes.
Deste modo, concluiu pela procedência da Representação e aplicação de multa aos Srs. Renato Tonidandel, Prefeito Municipal, Valdoir Rodrigues dos Santos, Guilherme Cavalheiro Nunes e Luiz Rodrigo Bocca, servidores públicos membros da Comissão Permanente de Licitação, por terem infringido os artigos 29 e 43, § 3º, da Lei nº 8.666/93.
Após publicação do Acórdão, de maneira tempestiva, os interessados apresentaram Recurso de Revista, alegando que as exigências ocorreram para garantir a melhor qualificação técnica e econômica, de modo que as decisões tomadas foram em conformidade às normas e condições presentes no instrumento convocatório, não havendo dano ao procedimento licitatório. Ao final, requerem o recebimento e processamento do Recurso de Revista para que, no mérito, seja dado provimento a fim de reformar a decisão contida no Acórdão nº 1000/23, julgando-o improcedente, haja vista atendimento aos ditames da Lei nº 8.666/93 e dos princípios basilares do direito administrativo e das normas contidas nos artigos 20 e 22 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.
Os autos continuam tramitando e aguardam novo julgamento pelo Tribunal Pleno do TCE-PR.
Informação para consulta processual
Processo nº: 118187/22 Acórdão nº 1000/23 – Tribunal Pleno Assunto: Representação da Lei nº 8.666/1993 Entidade: Município de Santa Lúcia Relator: Conselheiro Maurício Requião de Mello e Silva