O Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR) apresentou petição intermediária visando a nulidade da certidão de trânsito em julgado emitida no processo nº 764700/21, após publicação do Acórdão nº 645/24 do Pleno do Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR). Com isso, o órgão ministerial busca a reabertura do prazo recursal, uma vez que após transitada em julgado, a decisão torna-se definitiva, não podendo mais ser alvo de recurso.
A petição foi motivada em razão da ausência de encaminhamento ao MPC-PR para ciência da decisão, em flagrante desacordo ao artigo 475 do Regimento Interno do TCE-PR, que define que o Procurador-Geral deverá ser intimado para manifestar-se no prazo recursal, em no máximo 10 dias, devendo haver nova oitiva ministerial e instrução conclusiva da unidade técnica.
Entenda o caso
O referido processo trata sobre denúncia formulada em face do Município de Pato Bragado, em que se questiona sobre a possível criação irregular de cargo com exigência de nível superior (Colaborador Profissional II – Contador) no quadro do Poder Executivo, com previsão de remuneração inferior ao cargo de nível médio que foi colocado em extinção (Agente de Finanças – Contabilista), em aparente violação ao artigo 37, inciso XII da Constituição Federal, o qual define que a lei fixará tabela única de vencimentos para toda Administração Pública.
O denunciante aponta que o vencimento básico inicial do contador da estrutura ativa do Poder Executivo do Município, além de ser incompatível com o valor de mercado, por conta da exigência de formação superior em relação aos outros dois contadores, é menor do que o vencimento básico inicial dos demais contadores (contador do Poder Executivo da estrutura extinta e contador do Poder Legislativo estrutura ativa). Sustenta, ainda, que a Lei Orgânica e o Estatuto dos Servidores Públicos do Município de Pato Bragado garantem a isonomia de vencimentos para cargos de atribuições iguais ou semelhantes do mesmo poder ou entre servidores dos Poderes Legislativos e Executivo.
Intimado a se manifestar, o Município argumentou que não foi uma medida isolada com um único servidor público, mas uma motivação prévia a realização de novo concurso público, ao qual os candidatos tinham ciência dos vencimentos que iriam receber, em que carreira estavam e como deveriam proceder para sua progressão. Ademais, afirmou que os motivos foram bem justificados, havendo a preocupação do gestor na época em não inflar a folha de pagamento do Município com patamares insustentáveis (o que ocorreria caso não fosse criada nova carreira).
Análise técnica
A Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) opinou pela procedência parcial da denúncia em relação ao ponto que trata sobre a superioridade de vencimentos do Poder Legislativo sobre o Poder Executivo. Além disso, sugeriu a expedição de recomendação à Câmara para que, quando da concessão de reajustes aos seus servidores, observe os vencimentos pagos aos cargos assemelhados pelo Poder Executivo, em cumprimento ao artigo 37, inciso XII, da Constituição Federal.
Por sua vez, o Ministério Público de Contas apontou que é inconstitucional a criação de novo cargo com vencimentos inferiores àquele colocado em extinção, sob o argumento de que a mudança do requisito de investidura de formação de nível médio para nível superior teria como obrigatória consequência a majoração do padrão remuneratório do cargo de ‘Colaborador Profissional II – Contador’, e não a sua redução.
Conforme o Parecer Ministerial nº 693/23, ainda sugeriu a emissão de determinação ao Município para que comprove a instituição de um Conselho de Política de Administração e Remuneração de Pessoal, bem como que o referido Conselho apresente proposta de adequação do padrão remuneratório para o cargo de ‘Colaborador Profissional II – Contador’ – de nível superior – criado pela Lei Municipal nº 873/2007, mediante a fixação de tabela de vencimentos acima daquela definida em relação ao extinto cargo de ‘Agente de Finanças – Contabilista’, respeitadas as progressões dos respectivos planos de carreira e observadas as exigências de natureza orçamentária e fiscal.
Em paralelo ao andamento dos autos, o Município de Pato Bragado promulgou a Lei Municipal nº 1.824/2023, que dispõe sobre criação de cargo de provimento efetivo e altera tabela do quadro de provimento efetivo da Câmara Municipal de Pato Bragado, além de outras providências. Contudo, conforme o Parecer nº 903/23, o MPC-PR verificou que a nova legislação não é capaz de afastar a irregularidade do apontamento de superioridade de vencimentos do Poder Legislativo sobre o Poder Executivo, mantendo seu opinativo pela procedência da denúncia.
Decisão
Os membros do Tribunal Pleno votaram, em unanimidade, pela procedência parcial da presente denúncia somente em relação à fixação dos vencimentos do cargo de contador do Poder Legislativo de Pato Bragado, conforme definido na recente Lei Municipal n.º 1.824/2023, em valor superior ao limite/teto estipulado para cargo assemelhado no âmbito do Poder Executivo, considerada a proporcionalidade das respectivas cargas horárias, em aparente violação ao art. 37, inc. XII da CF/88 e art. 27, inc. XII da CE/PR, além de afronta a precedentes normativos e vinculantes neste Tribunal de Contas (Acórdão n.º 273/16 – Tribunal Pleno e Acórdão n.º 513/21 – Tribunal Pleno).
Além disso, recomendaram à Câmara Municipal a necessidade de adequação da Lei Orgânica do Município e do Regimento Interno da Câmara, a fim de garantir a conformidade que dispõe o artigo 37, inciso X da Constituição Federal, o qual exige a edição de lei específica para tratar sobre vencimento dos cargos da administração pública. Não obstante, a recomendação se estende ao Prefeito Municipal de Pato Bragado e ao Procurador-Geral de Justiça para que avaliem a oportunidade e conveniência de propositura de ação direta de inconstitucionalidade em face da Lei Municipal nº 1.824/2023, dada sua aparente afronta ao artigo 27, inciso XII da Constituição do Estado do Paraná.
Petição Ministerial
Em que pese a decisão do Pleno tenha acompanhado o entendimento do MPC-PR, os autos não foram encaminhados ao Parquet para abertura de prazo recursal, conforme previsto no regimento interno da Corte de Contas. Por este motivo, a 4ª Procuradoria de Contas apresentou petição intermediária requerendo a anulação da Certidão de Trânsito em Julgado nº 364/24, visto que o Acórdão nº 645/24, publicado no Diário Eletrônico do Tribunal de Contas (DETC) em 27/03/2024, somente alcançou a intimação dos interessados nominalmente identificados no teor da decisão, de forma que se impõe a retificação da citada certidão e sua respectiva publicação, para que, em seguida, proceda-se à correta intimação do MPC-PR na forma regimental.
Na mesma oportunidade, o órgão ministerial destacou seu interesse recursal, o qual diz respeito à dois aspectos principais: (I) necessidade de remessa dos autos à Coordenadoria-Geral de Fiscalização (CGF), conforme expressamente previsto na parte final da fundamentação do Acórdão nº 645/24, cuja omissão é passível de ser suprida em sede de Embargos de Declaração e; (II) pela necessidade de que a recomendação dirigida à Câmara de Pato Bragado seja expedida na forma de determinação, por se tratar de obrigação de fazer diretamente conectada à observância de normas constitucionais, que por sua natureza possuem caráter compulsório e devem ser atendidas pelo gestor.
No momento os autos aguardam manifestação do Relator.
Informação para consulta processual
Processo nº: 764700/21 Acórdão nº: Acórdão nº 645/24 – Tribunal Pleno Assunto: Denúncia Entidade: Município de Pato Bragado Relator: Conselheiro Jose Durval Mattos do Amaral