Município pode incluir despesas com preparo de merenda escolar no cálculo de gastos com manutenção e desenvolvimento do ensino

Cataratas do Iguaçu, principal atração turística do Paraná, localizadas no Município de Foz do Iguaçu. Foto: divulgação.

Os gastos com o preparo de merenda escolar podem ser utilizados para atingimento do índice de 25% da receita de impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino, conforme previsto no caput do artigo 212 da Constituição Federal.  

Este foi o entendimento adotado pelos membros do Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR) ao julgar processo de consulta promovido pelo Município de Foz do Iguaçu (Acórdão nº 2533/23), no qual se indagou sobre a aplicação de despesas em Educação (MDE) para custear os serviços prestados por merendeiras, referente ao preparo da alimentação escolar, e se seria possível seu enquadramento no artigo 70, incisos I, III e V da Lei nº 9.394/96, responsável por estabelecer as diretrizes e bases da educação nacional.  

Instrução  

Após realizado o juízo de admissibilidade, o Relator Conselheiro Nestor Baptista recebeu a consulta protocolada pelo Município de Foz do Iguaçu, oportunidade em que determinou a instrução do feito pelas coordenadorias técnicas do TCE-PR e, posteriormente, pela manifestação do Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR). 

Instada a se manifestar, a Supervisão de Jurisprudência e Biblioteca (SJB) apresentou quatro julgados com tema semelhante, destacando as citações sobre despesas com merenda escolar e utilização de gastos para atingimento do índice de 25% de receita com impostos.  

Na sequência os autos foram encaminhados à Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM), a qual opinou no sentido de que os profissionais responsáveis pelos relevantes serviços de preparo da alimentação escolar podem ser efetivamente enquadrados no conceito lato de “demais profissionais da educação”. Do mesmo modo, a alimentação escolar é atividade meio notadamente necessária ao funcionamento dos sistemas de ensino, não olvidando-se que uma alimentação adequada é essencial para o sucesso de qualquer programa de aprendizagem.  

No entanto, ao considerar que se trata de programa suplementar de alimentação, as despesas com os serviços prestados pelas merendeiras (cuja natureza é de contribuição social), não podem ser utilizadas para atingimento do índice de 25% da receita de impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino. Diante do exposto, concluiu pelo conhecimento da Consulta e resposta nos seguintes termos: “Despesas concernentes ao preparo da alimentação escolar não podem ser compreendidas como de manutenção e desenvolvimento do ensino para os fins do que dispõe o caput do artigo 212 do texto constitucional.” 

Não obstante, o Ministério Público de Contas, conforme Parecer nº 83/23, acompanhou o entendimento da unidade técnica e opinou pela resposta nos mesmos termos da Instrução, ao considerar que a Constituição Federal traçou as diretrizes que priorizam as ações relacionadas diretamente a educação, que devem ser financiadas pela receita resultante de impostos vinculada à manutenção e desenvolvimento do ensino, direcionando, contudo, para outras fontes de custeio as ações suplementares relativas à alimentação do aluno. 

Citou ainda que, a Lei nº 9.394/96 – responsável por estabelecer as diretrizes e bases da educação nacional – conforme artigos 70 e 71, definiu as despesas que poderão ou não ser consideradas como de manutenção e desenvolvimento do ensino. De acordo com o texto normativo, somente as despesas em programas definidos pelo artigo 70 podem ser computadas para fins de cumprimento do índice de 25% da receita de impostos, de modo que a satisfação deste índice deve considerar, exclusivamente, as receitas provenientes de impostos, afastando, assim, as receitas destinadas à educação advindas de outros tributos, ainda que para custeio de programas definidos como manutenção e desenvolvimento do ensino. 

Julgamento 

Em sede de julgamento, diante dos entendimentos divergentes dos Conselheiros Augustinho Zucchi e Ivens Zschoerper Linhares, prevaleceu o voto deste último, conforme proposta de voto contida no Acórdão nº 2533/23Em sua fundamentação, o relator Conselheiro Ivens Zschoerper Linhares considerou necessário traçar uma distinção entre o fornecimento de alimentação à população carente com medida assistencialista, e o fornecimento de merenda escolar exclusivamente aos alunos, dentro da escola.  

Destacou ainda que o fato de existir especificamente para a alimentação escolar previsão legal de recursos específicos, como as contribuições sociais (por exemplo, o salário-educação), o Plano Nacional de Alimentação Escolar – PNAE (Lei nº 11.947/2009) e outros recursos orçamentários a que se refere o §4º do art. 212 da Constituição Federal, não devem servir de impedimento para a utilização discricionária de receitas de impostos para o preparo da merenda escolar e seu consequente aproveitamento no MDE. 

Assim, a interpretação foi no sentido de que os programas suplementares de alimentação devem ser necessariamente financiados com recursos provenientes de contribuições sociais, não constituindo óbice para o entendimento de que as despesas com o preparo da alimentação escolar não possuem característica de suplementaridade, mas sim de atividade-meio necessária ao funcionamento dos sistemas de ensino, nos termos do artigo 70, V, da LDB, podendo desta forma comporem as despesas com profissionais da educação, de que se trata o inciso I do mesmo artigo. 

Em face do exposto, os membros do Tribunal Pleno decidiram, por maioria absoluta, responder à consulta conforme voto sugerido pelo Conselheiro Ivens Zschoerper Linhares, nos seguintes termos: “os gastos com o preparo da merenda escolar possam ser utilizados para o atingimento do índice de 25% da receita de impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino, previsto no caput do artigo 212 da Constituição Federal de 1988, mantendo-se a metodologia de cálculo atualmente utilizada pela Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM)”. 

Informação para consulta processual

Processo nº: 518991/22
Acórdão nº: Acórdão n° 2533/23 – Tribunal Pleno
Assunto: Consulta
Entidade: Município de Foz do Iguaçu
Relator: Conselheiro Ivens Zschoerper Linhares