O Município de Boa Vista da Aparecida deve se abster de contratar de forma terceirizada serviços de contabilidade, que se configurem como atividades típicas e permanentes da administração pública. Essa foi a decisão do Pleno do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR), ao julgar parcialmente procedente a Representação proposta pelo Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR).
A decisão, expressa no Acórdão n° 1376/22, se deu em razão da inobservância do artigo 39 da Constituição Estadual e do Prejulgado nº 06, a par do artigo 37, caput e incisos I e II da Constituição Federal, na contratação terceirizada de serviços de contabilidade pelo Município.
Representação
Na inicial, o MPC-PR apontou ter verificado irregularidades no Contrato nº 96/2018, celebrado entre o Município de Boa Vista da Aparecida e microempresa de consultoria contábil, por ofensa ao entendimento fixado pelo TCE-PR no Prejulgado nº 6 e ao artigo 39 da Constituição do Estado do Paraná. Ambos os textos vedam a contratação de serviços de terceiros para a realização de atividades que possam ser regularmente exercidas por servidores públicos, devidamente aprovados em concurso público. Ainda, destacou que a contratação de consultorias contábeis e jurídicas exigem notória especialização, sendo necessária a demonstração de singularidade do objeto e/ou alta demanda de complexidade, casos em que poderá haver contratação direta e desde que seja para um objeto específico e com prazo determinado, não podendo ser destinado para as finalidades de acompanhamento de gestão.
Neste sentido, o órgão ministerial observou que o citado contrato não se enquadrava em nenhuma das hipóteses admitidas pelo Prejulgado nº 06, bem como destacou a possibilidade de eventual parentesco do assessor técnico contábil da Prefeitura Municipal com o titular da empresa contratada, além da ocorrência de aparente duplicidade de um dos objetos do contrato. Desta maneira, requereu a concessão da medida cautelar para que fosse determinada a imediata suspensão da execução do Contrato nº 96/2018, além da conversão dos autos em Tomada de Contas Extraordinária e da instauração de procedimentos similares para tantos quantos fossem os contratos de assessoria contábil firmados por Municípios paranaenses com a empresa mencionada e, também, a inclusão, no polo passivo, do Controlador Interno do Município.
Instrução do Processo
O relator do processo, Conselheiro Nestor Baptista, mediante o Despacho n° 713/21 deferiu a medida cautelar, determinando a imediata suspensão do Contrato nº 96/2018 e de qualquer pagamento à empresa citada, com vistas a resguardar o erário municipal.
Na sequência, as partes exerceram o direito de contraditório alegando, em suma, que não houve substituição das atividades cotidianas dos servidores públicos, visto que a empresa contratada realizada serviços de outra natureza em relação a temas que ultrapassam as funções ordinárias da administração pública, tendo em vista a condição de especialização e capacidade técnica para serviço de alta complexidade.
Instada a se manifestar, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) opinou que diante dos fatos apresentados, restou claro que a empresa contratada está prestando serviços que deveriam ser prestados primeiramente pelos agentes políticos e, depois, pelos servidores públicos concursados. Concluiu pela procedência da Representação e manutenção da cautelar deferida, além de determinação para rescisão do Contrato nº 96/2018 e seus aditivos, devendo os servidores admitidos em concurso público realizarem as funções típicas de seus cargos.
Em nova manifestação, por meio do Parecer n° 51/22, o Ministério Público de Contas reiterou os argumentos trazidos na inicial, discordando, contudo, do opinativo da unidade técnica no que diz respeito a contratação de escritório de advocacia para representação do Município perante o Tribunal de Contas. Nesse contexto, o MPC-PR destacou que tal contratação representou uma indevida sobreposição dos serviços anteriormente ajustados no contrato firmado com a microempresa de consultoria contábil, cabendo a imputação de responsabilização ressarcitória solidária do Prefeito e da citada empresa em ressarcir ao erário.
Decisão
Em sede de julgamento, o relator votou pela procedência parcial da Representação, devido a terceirização irregular de serviços de contabilidade em ofensa ao art. 37, II, da Constituição Federal e ao art. 39 da Constituição Estadual, assim como pela inobservância dos parâmetros dispostos no Prejulgado nº 6.
Ainda, expediu determinações a fim de que o atual gestor rescinda o Contrato nº 96/2018 e se abstenha de celebrar ou dar continuidade a novas contratações de mesmo conteúdo ou natureza. Por fim, determinou ainda a juntada de cópia dos autos ao processo de Prestação de Contas de Prefeito relativa ao exercício de 2018, 2019, 2020 e 2021, para oportuna consideração dos fatos constatados.
Mediante a decisão contida no Acórdão nº 1376/22, os membros do Tribunal Pleno acompanharam, por unanimidade, o voto do relator, determinando também a aplicação de multas individuais no valor de R$ 5.150,80, que corresponde a 40 vezes o valor da Unidade Padrão Fiscal do Estado do Paraná (UPF-PR), ao Prefeito de Boa Vista da Aparecida e ao responsável pela microempresa de consultoria contábil.
Informação para consulta processual
Processo nº: 448140/21 Acórdão nº: 1376/22 – Tribunal Pleno Assunto: Representação Entidade: Município de Boa Vista da Aparecida Relator: Conselheiro Nestor Baptista