Representação MPC-PR: Almirante Tamandaré deve contabilizar contratações de serviços médicos como despesas de pessoal

Visão aérea do Município de Almirante Tamandaré, localizado na região metropolitana de Curitiba. Foto: divulgação.

O Município de Almirante Tamandaré deve, no prazo de 30 dias, adequar seus procedimentos, para que passe a contabilizar as despesas decorrentes de contratações de serviços médicos terceirizados no item “Outras Despesas de Pessoal”, em conformidade com as diretrizes da Instrução Normativa n° 56/2011 e a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF (Lei Complementar n° 101/2000).  

Essa foi uma das determinações do Pleno do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR), ao julgar parcialmente procedente a Representação, com medida cautelar, apresentada pelo Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR) contra o Município de Almirante Tamandaré. Na inicial, o órgão ministerial apontou a existência de irregularidades relativas a terceirização irregular do serviço público de saúde, incorreta contabilização das despesas e do não atendimento à Lei de Acesso à Informação – LAI (Lei n.º 12.527/2011). 

Na decisão, mediante o Acórdão n° 1661/24, o Relator Conselheiro Jose Durval Mattos do Amaral concluiu que o Município deixou de adotar as medidas necessárias para regularizar as impropriedades apontadas. Por essas razões, também foi determinada a aplicação da multa administrativa prevista no artigo 87, IV, “g” da Lei Complementar n° 113/05, ao Prefeito Gerson Denilson Colodel (gestão 2017/2020) e ao Secretário Municipal de Saúde, João Gustavo Kepes Noronha.  

Entenda o caso 

Durante a execução do Projeto de Fiscalização de Terceirização de Médicos Plantonistas, o MPC-PR identificou que havia uma defasagem do quadro de cargos do Município, tendo em vista que apenas 11 dos 128 cargos estatutários de Médicos criados por Lei Municipal se encontravam preenchidos. Ademais, atividades de urgência e emergência na Unidade de Pronto Atendimento, e regulares nas Unidades Básicas de Saúde, que configuram prestação de saúde básica, estavam sendo indevidamente transferidas a empresas privadas, por meio de terceirizações. 

Somada a essa questão, foi verificada a contabilização irregular das despesas decorrentes dessas contratações, as quais deveriam ser cadastradas como “Outras Despesas de Pessoal”. Por fim, o MPC-PR ainda apontou o descumprimento da Lei de Acesso à Informação, uma vez que, embora constem dados básicos da contratação, não são disponibilizados para consulta os procedimentos licitatórios e os contratos firmados, sendo que as informações relacionadas aos empenhos não permitem a aferição de quais são os serviços prestados. 

Defesa 

Após recebimento da Representação, o Relator determinou a citação das partes, a fim de subsidiar a análise dos pedidos cautelares. Em resposta, o Município defendeu a regularidade das contratações, alegando que se tratava de serviços de média e alta complexidade, de maneira complementar, e que fogem, portanto, da competência municipal.  

Esclareceu que em 2015 foi realizado um concurso público para provimento efetivo de diversos cargos na área da saúde, tendo sido provido apenas o cargo de Médico do Trabalho. Para as demais especialidades, ou não houve candidato aprovado, ou os convocados não tomaram posse, de modo que o Município atualmente possui apenas 13 concursados e 13 bolsistas como Médicos, sendo imprescindíveis as contratações efetivadas para atendimento da população.  

Por meio de Despacho n° 996/19, o Relator indeferiu os pedidos cautelares e determinou nova intimação do Município de Almirante Tamandaré, por meio do Prefeito Gerson Denilson Colodel e do Secretário Municipal de Saúde, João Gustavo Kepes de Noronha. 

Em manifestação conjunta, os interessados abordaram a dificuldade dos Municípios paranaenses em contratar profissionais médicos, pontuando que o Tribunal de Contas da União (TCU) entende adequada a realização de credenciamento de pessoas físicas e jurídicas para a prestação de serviços na área da saúde. 

Quanto à contabilização das despesas, alegaram que os contratos de terceirização não devem ser computados para fins de verificação dos limites de gastos com pessoal, especialmente porque se referem a “horas trabalhadas”, e não a profissional específico, além de incluírem serviços de complementação que não integram a atenção básica. 

Instrução do processo 

Instada a se manifestar, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) observou que, de 2013 a 2019, foram realizadas as Inexigibilidades n° 06/2013 e 04/2018 e os Credenciamentos n° 05/2018 e 03/2019 para contratação de empresas para prestação de serviços médicos em Unidades Básicas de Saúde e na Unidade de Pronto Atendimento. 

Além disso, verificou que, atualmente, existem apenas 8 servidores ativos no cargo de Médico, embora exista a previsão de 128 vagas criadas por Lei Municipal. Nesse sentido, observou que a respeito da falta de interessados para os cargos de Médico oferecidos no último concurso, a qual pode ter decorrido da baixa remuneração oferecida, fato é que o Município de Almirante Tamandaré não realizou novas tentativas de seleção, nem mesmo via processo seletivo simplificado.  

Quanto à violação à Lei da Transparência, a unidade técnica informou que nos aditivos contratuais localizados no Portal da Transparência, é possível acessar a íntegra do processo licitatório. Contudo, em relação aos empenhos, as informações neles constantes são genéricas, sem indicação do número de horas executadas, do valor da hora laborada e do profissional responsável pelo atendimento.  

Diante dos fatos, concluiu pela procedência parcial da Representação, com a aplicação da multa prevista no artigo 87, IV, “g”, da LC n.º 113/2005 ao Prefeito e Secretário Municipal de Saúde, sem prejuízo da expedição de determinações e recomendações. 

Ministério Público de Contas 

Por sua vez, o Ministério Público de Contas acompanhou parcialmente o opinativo técnico, divergindo apenas quanto à possibilidade de exclusão dos valores despendidos com os plantões noturnos do cálculo de despesas com pessoal. Conforme fundamentado no Parecer n° 45/23, observou que, tendo o Município assumido para si a gestão dos serviços de urgência e emergência, não haveria como enquadrá-los como serviços complementares de saúde. 

Além disso, a não inclusão desses valores no cálculo de gastos com pessoal levou ao atingimento de um índice equivocado pela Municipalidade, mais baixo do que a realidade, motivo pelo qual o MPC-PR sugeriu a penalização do gestor, com aplicação de multa e expedição de determinação para que o Município, imediatamente, corrija a forma de contabilizar os gastos decorrentes de contratos de terceirização de mão de obra de serviços básicos de saúde como “Outras Despesas de Pessoal”. 

Ao final, se manifestou pela procedência parcial da Representação, nos termos especificados no parecer ministerial, além da sugestão de comunicação ao Ministério Público Estadual (MPPR) para adoção das medidas cabíveis.  

Decisão 

Em sede de julgamento, conforme voto contido no Acórdão nº 1661/24 do Tribunal Pleno, o Relator concluiu que restou evidenciado a substituição de mão-de-obra por meio da terceirização, uma vez que o Município não se prestou a adotar quaisquer providências a fim de viabilizar o preenchimento do seu quadro funcional mediante a realização de concurso. Dessa forma, determinou a aplicação de multa ao Prefeito e Secretário Municipal de Saúde. 

Destacou que o artigo 199, §1° da Constituição Federal estabelece que a participação da iniciativa privada no SUS deve ocorrer de forma complementar, o que, conforme Portaria n° 1.034/2010 do Ministério da Saúde, significa que os serviços privados de saúde podem ser utilizados “quando estiver sendo utilizada toda a capacidade dos Municípios e não for possível a sua ampliação, de forma justificada e comprovada”. Frisou que essa noção de complementaridade tem norteado as decisões do TCE-PR, então reafirmada no âmbito da Consulta n° 225358/22. 

Em relação a expedição de determinação para que o Município comprove a realização de concurso público, proposta tanto pelo MPC-PR quanto pela unidade técnica, o Relator Conselheiro Jose Durval Mattos do Amaral entendeu que a situação do ente exige a realização de alterações remuneratórias na carreira médica, de modo que não cabe ao TCE-PR intervir em tais questões por meio de determinação.  

Desta forma, votou pela emissão de recomendação, para que o Município adote as providências necessárias a fim de viabilizar o preenchimento do seu quadro de servidores, o qual deverá ser objeto de monitoramento pela Coordenadoria de Monitoramento e Execuções (CMEX), devendo a municipalidade enviar, em períodos trimestrais, atualizações sobre a situação. 

Além disso, determinou que, no prazo de 30 dias contados a partir da publicação do Acórdão, adeque seu Portal da Transparência às disposições da Lei n° 12.527/2011, e passe a contabilizar as despesas com contratações de serviços médicos, nos casos que envolvam a prestação de serviços de Atenção Básica de Saúdem, como “Outras Despesas de Pessoal”, em conformidade com as diretrizes da Instrução Normativa n° 56/2011 e da LRF. 

Os Membros do Tribunal Pleno acompanharam por unanimidade o voto do Relator, conforme a decisão expressa no Acórdão n° 1661/24, publicado no Diário Eletrônico do TCE-PR n° 3240, de 1° de julho de 2024. 

Recurso 

Por meio de Embargos de Declaração, o MPC-PR apresentou recurso contra a decisão, apenas em razão da omissão de manifestação sobre a sugestão de envio de cópia dos autos ao Ministério Público Estadual. 

No momento, o processo aguarda nova manifestação do Relator.  

Informação para consulta processual

Processo nº: 497911/19
Acórdão nº: Acórdão  nº 1661/24 – Tribunal Pleno
Assunto: Representação
Entidade: Município de Almirante Tamandaré
Relator: Conselheiro Jose Durval Mattos do Amaral