O município de São Mateus do Sul deve se abster de realizar contratações de médicos como forma de terceirização ilícita de mão de obra em detrimento da regra do concurso público, conforme previsto no artigo 37, II da Constituição Federal. Essa foi uma das recomendações expedidas pelo Pleno do Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR), que julgou parcialmente procedente a Representação nº 532008/19 protocolada pelo MP de Contas do Paraná (MPC-PR).
Durante a execução do Projeto de Fiscalização das Terceirizações de Médicos Plantonistas, o órgão ministerial identificou indícios de irregularidades nas contratações de médicos para a prestação de serviços na área da saúde. Em síntese, apontou que há uma defasagem do quadro de cargos, tendo em vista que somente 17 das 33 vagas de médico estão preenchidas; que há inadequação dos procedimentos licitatórios para a contratação de médicos, pois os mesmos têm ocorrido por meio de dispensa de licitação e pregão; e que o município não tem disponibilizado em seu Portal da transparência a íntegra das informações referentes as contratações dos serviços médicos.
Este último item motivou o pedido de medida cautelar para que o município de Mateus do Sul disponibilizasse as informações referentes aos empenhos realizados, a fim de possibilitar a fiscalização nos portais de transparência e, consequentemente, o controle social. Considerando o caráter de urgência, o relator Conselheiro Artagão de Mattos Leão concedeu a liminar, mediante o Acórdão nº 2541/19.
Instrução do Processo
Em sua defesa, o município apresentou contraditório alegando que não merece provimento a respectiva Representação, uma vez que o gestor municipal teria realizado a contratação regular de serviços médicos e já teria iniciado os procedimentos para realização de concurso público, e respeitado a Lei de Acesso à Informação (Lei n° 12.527/11).
Instada a se manifestar, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) opinou pela parcial procedência da Representação, tendo em vista que o apoio da iniciativa privada na área da saúde deve ocorrer com vistas a melhorar o atendimento à população em caráter complementar. Destacou, ainda, que quando a terceirização não se dá de forma complementar, caracteriza-se ofensa ao artigo 37, inciso II da Constituição Federal, o qual estabelece a obrigatoriedade de realização de concurso público para preenchimento das vagas disponíveis.
Em relação aos procedimentos licitatórios utilizados pelo município, observou que já existe entendimento firmado pelo TCE-PR de que a modalidade pregão é inviável para contratação de profissionais para prestação de serviços médicos, por não se enquadrar nas definições de objeto de serviço comum. Diante disso, a CGM entende ser necessária a expedição de determinação para que o ente municipal se abstenha de utilizar tal modalidade quando cabível a contratação de médicos via licitação, isso quando tiver tão somente caráter complementar.
Em nova manifestação, por meio do Parecer nº 49/21, o MP de Contas acompanhou o voto da unidade técnica pela procedência parcial da Representação, com emissão de determinações ao município, inclusive quanto à proposta de obrigação de fazer, consistente no registro, na fase de liquidação de despesa, das informações relativas à especificação das horas efetivamente prestadas, com indicação dos profissionais responsáveis.
Além disso, apontou que em consulta ao sistema SIAP, verificou-se que em janeiro de 2019 foi autuado neste Tribunal o processo de Requerimento de Análise Técnica nº 20766/19, relativo ao procedimento administrativo de concurso público para provimento do cargo de médico plantonista (12×36) no quadro permanente efetivo da Prefeitura Municipal de São Mateus do Sul, cujo último documento juntado é o Termo de Rescisão Unilateral do Contrato nº 249/2019 celebrado com a empresa ABCON, subscrito em 11.02.2020, de modo que, a toda evidência, até o momento não houve deflagração do edital de concurso para provimento do referido cargo.
O MP de Contas ainda refutou indispensável a notificação pessoal da Chefe do Poder Executivo, bem como da atual Controladora Interna, a respeito do teor da decisão que vier a ser proferida, para ciência e adoção das medidas cabíveis, uma vez que não figuram como partes interessadas nesse processo.
Decisão
Por força do Acórdão nº 478/21, o Tribunal Pleno determinou que o município adeque, no prazo de 60 dias, seu portal de transparência às disposições trazidas pela Lei nº 12.527/2011 e da Lei Estadual nº 19.581/2018, no prazo de 60 dias, disponibilizando na íntegra os procedimentos licitatórios e contratos.
Corroborando com o entendimento da CGM, foram expedidas três recomendações no sentido de que a municipalidade se abstenha de realizar contratações de médicos como forma de terceirização ilícita de mão de obra em detrimento da regra do concurso público; que nos casos em que seja viável a contratação de serviços médicos por meio da realização de procedimento licitatório, se abstenha de utilizar a modalidade pregão; e que registre, na fase de liquidação de despesa, as informações relativas à especificação das horas efetivamente prestadas, com indicação dos profissionais responsáveis.
Por fim, acompanhando a sugestão do MP de Contas determinou-se que, após o trânsito em julgado, remeta-se à Coordenadoria de Monitoramento e Execuções (CMEX) para registros, notificando-se pessoalmente a Chefe do Poder Executivo, Sra. Fernanda Saldanha, bem como a atual Controladora Interna, nos termos do artigo 301, parágrafo único, do Regimento Interno, tendo em vista o artigo 28 da Lei Orgânica e o artigo 175-L do Regimento Interno.
A íntegra da decisão, proferida no Acórdão nº 478/21 durante a sessão virtual nº 13 de 4 de março de 2021 está disponível aqui.
Informação para consulta processual
Processo nº: 532008/19 Acórdão de Parecer Prévio nº: 478/21 – Tribunal Pleno Assunto: Representação Entidade: Flávio de Azambuja Berti Interessado: Flávio de Azambuja Berti, Luiz Adyr Gonçalves Pereira, Ministério Público Junto ao Tribunal de Contas do Estado do Paraná, Município de São Mateus do Sul Relator: Conselheiro Artagão de Mattos Leão